Newsletter – fevereiro de 2020

Confira a edição de fevereiro da newsletter da Transparência Brasil. Ela tem periodicidade mensal e você também pode recebê-la no seu e-mail assim que ela fica pronta, inscrevendo-se aqui.

Além dos informes das atividades da Transparência Brasil, nossa newsletter também traz informações relevantes sobre os temas de transparência, controle social, integridade outras notícias que foram destaque no mês. Acesse a edição completa .

Destaques de fevereiro:

  • Retorno do Fórum do Direito de Acesso a Informações Públicas;
  • O aumento das negativas a pedidos de acesso a informação por fishing expedition;
  • Informações da participação da sociedade civil na 12th International Conference for Information Commissioners.

[Coluna 27]: Expedição de Pescaria em pedidos de acesso a informação

De acordo com uma reportagem recente da Agência Pública, órgãos do governo federal têm negado uma série de pedidos de acesso a informação sob a justificativa de que estes incorrem em uma prática chamada “expedição de pescaria” (fishing expedition). Afinal, o que vem a ser essa prática e por que ela é relevante para entendermos os riscos dessas negativas à transparência pública?

O que é a “expedição de pescaria”?

“Expedição de pescaria” ou “fishing expedition”, no original em inglês, designa a tentativa – em geral da polícia – de encontrar alguma informação incriminadora a partir de uma busca ampla sem determinar um objetivo específico.

Elas acontecem, por exemplo, quando se autoriza buscas genéricas em favelas, sem delimitar um endereço específico ou um objetivo para a busca. Por expor o cidadão ao abuso de poder, dificultar sua defesa e a proteção de sua intimidade e honra, são necessários limites para esse tipo de prática por parte do estado. Ver post completo “[Coluna 27]: Expedição de Pescaria em pedidos de acesso a informação”

[Coluna 26]: Licença parental e cuidados na primeira infância

Nas próximas semanas, sairei em licença-paternidade. Não sei exatamente quando isso acontecerá – entraremos na 38ª semana de gravidez a partir de segunda-feira, 10/02 –, mas é obviamente algo que tem ocupado minha mente. Assim, aproveito o motivo para abordar esse tema na coluna.


Licença-paternidade

No Brasil, trabalhadores formais têm direito a cinco dias corridos de licença-paternidade. Isso significa que se seu filho ou filha nascer em um sábado – como aconteceu com minha primeira filha –, a licença acaba na quarta-feira seguinte. O tamanho da crueldade dessa política é inefável. Nossa legislação concede míseros cinco dias, e não são nem dias úteis.

Empresas cidadãs garantem aos pais 20 dias corridos de licença-paternidade, desde que o pai “comprove participação em programa ou atividade de orientação sobre paternidade responsável” (Lei 11.770/2008, art. 1º, § 1º, inciso I). Este requerimento extra, não exigido da mãe, mostra como o Estado ainda segue aquele mantra horrível, “não basta ser pai, é preciso participar”. Uma frase sem sentido, que jamais seria aplicável para mães.

Este requerimento é uma postura paternalista do Estado, que nunca fez uma avaliação de eficácia desse curso sobre o comportamento dos pais (é auto-seleção ou há efeito causal?), e considera que pais precisam de um curso para serem pais e terem direito a ficar com seus filhos por míseros 20 dias. Como se não bastasse, diferentemente da licença-maternidade – custeada pelo INSS – a licença-paternidade é custeada integralmente pela empresa¹.

De fato, ainda é prevalecente no Brasil a visão machista de que licença-paternidade seria férias adicionais. Esse estereótipo e a ausência de proteção legal geram problemas para os homens no mercado de trabalho. Em outros países, há evidências de que homens que saem em licença-paternidade têm menos chance de receberem promoções e são vistos como fracos e inseguros, entre outros adjetivos negativos.


Cuidados na primeira infância

Após o período de licença-paternidade, relega-se à mãe a obrigação principal de cuidar dos filhos recém-nascidos. Isso gera uma série de problemas, desde desigualdades no mercado de trabalho – impactos negativos em remuneração e carreira para mulheres – até mesmo riscos para a estabilidade dos casamentos. Há estudos sugerindo que ampliar a licença-paternidade reduz o risco de separação, no momento em que há maior chance de um casamento acabar – após o nascimento dos filhos. Um dos mecanismos que produz tal resultado é justamente a redução na desigualdade de responsabilidades de cuidados com as crianças.

Minha própria experiência como pai mostrou a importância de ficar um mês em casa com minha primeira filha. Aprendi todos os cuidados necessários para criar um filho: de trocar fraldas a dar banho, de cortar unhas a fazer o planejamento do que precisa ser comprado, de colocá-la para dormir a acordar à noite. Ao mesmo tempo, pude observar a quantidade de energia demandada com os cuidados de uma criança, especialmente com o primeiro filho, momento em que tudo é novo. Quando voltei a trabalhar, sabia que a rotina profissional seria menos exaustiva, emocional e fisicamente.

Creches

Além da licença-paternidade de duração ridícula, outro problema sério no Brasil é a oferta insuficiente de serviços de creches. O Plano Nacional de Educação (PNE), em sua meta 1, definiu que 50% das crianças de 0 a 3 anos deveriam estar em creches até 2024. Atualmente, o número é próximo de 30%, e já sabemos que há risco muito alto da meta não seja atingida.

Esse número de 50%, contudo, não distingue a oferta de vagas no setor privado e público, não considera a capacidade das famílias de pagar pelas vagas no setor privado, e nem avalia a qualidade do serviço oferecido. Nos EUA, considera-se que uma creche privada é acessível se custa menos de 10% da renda familiar. Não temos referência similar para o Brasil, nem qualquer indicador sobre o quanto as famílias gastam com cuidados infantis, sejam creches ou babás, como percentual de sua renda total.

Tampouco há, no PNE ou em qualquer outro plano do Ministério da Educação ou das secretarias de educação, indicadores sobre a qualidade das creches. Nos EUA, existe o Quality Rating and Improvement System (QRIS), ou Sistema de Avaliação e Melhoria de Qualidade, aplicado para o cuidado em creches e escolas da primeira infância.

Sistemas como o QRIS são importantes não apenas para auxiliar pais a escolherem as creches para seus filhos, mas também para auxiliar os programas governamentais de oferta de vagas via convênio com a iniciativa privada – caso da prefeitura de São Paulo – ou mesmo uso de vouchers, como aventou o ministro Paulo Guedes. Sem esses indicadores, não é possível avaliar se o dinheiro está sendo bem empregado, nem se os subsídios estariam aumentando ou reduzindo a qualidade dos serviços ofertados.

Como no Brasil os governos confundem metas-meio e metas-fim, planos como o PNE acabam sendo mal desenhados em relação aos objetivos que de fato estão perseguindo. O objetivo de uma política de primeira infância deve ser garantir os cuidados que uma criança precisa para se desenvolver da melhor maneira possível. A oferta de vagas é um meio para tal fim, mas não um fim em si mesmo.

Evidências e transparência

Do nosso ponto de vista, nossa contribuição para esses debates é chamar a atenção para a necessidade de se criar indicadores, como o QRIS dos EUA, e dar-lhes a transparência adequada, para ajudar pais e cuidadores e tomarem decisões informadas, bem como permitir o adequado trabalho dos órgãos de controle e o controle social. A discussão é complexa e precisamos estabelecer conceitos, indicadores e metas o quanto antes. Já estamos atrasados.

Similarmente, não há acompanhamento nem metas, por parte dos governos nas três esferas, para avaliar o impacto da ampliação da licença-paternidade de cinco para 20 dias. Seria muito importante que o governo realizasse essa avaliação, inclusive para fundamentar melhor o impacto de se estender os 20 dias para todos os trabalhadores da CLT, bem como para eventualmente planejar uma ampliação para ainda mais dias.

Como temos insistido há algum tempo, o Brasil precisa começar a se concentrar no controle de efetividade das políticas públicas, em vez de trabalhar somente com ênfase no controle de legalidade delas. A construção dos indicadores de qualidade e efetividade das políticas públicas é um passo fundamental nesse sentido. A primeira infância, por sua importância e estado atual, seria um dos melhores e mais urgentes setores de políticas públicas para se iniciar essa mudança. Oxalá possamos caminhar nessa direção, o mais rápido possível.


Manoel Galdino
Diretor-executivo da Transparência Brasil

[1] Empresas optantes
por pagar impostos por lucro real (em vez de lucro presumido, por exemplo) podem deduzir o montante pago durante a licença do imposto de renda.

Carta à Ministra Rosa Weber solicita a publicação dos extratos bancários dos partidos em tempo real

Brasília, 03 de fevereiro de 2020.

A Sua Excelência a Senhora
ROSA MARIA PIRES WEBER
Presidente do Tribunal Superior Eleitoral
Setor de Administração Federal Sul
Brasília/DF

Em mãos

C/c: Exmo. Sr. Ministro Luís Roberto Barroso – Vice-presidente
Exmo. Sr. Ministro Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes – Corregedor-Geral
Exmo. Sr. Ministro Luís Felipe Salomão
Exmo. Sr. Ministro Luiz Edson Fachin
Exmo. Sr. Ministro Sérgio Silveira Banhos
Exmo. Sr. Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto
Exmo. Sr. Procurador-Geral Eleitoral Humberto Jacques de Medeiros

Ref.: Resolução nº 23.604, de 17 de dezembro de 2019

Excelentíssima Senhora Ministra Rosa Weber,

TRANSPARÊNCIA PARTIDÁRIA, iniciativa da sociedade civil fundada em 2016 para desenvolvimento de pesquisas sobre o sistema partidário brasileiro e fomento de sua transparência e integridade, neste ato representada por seu diretor-executivo; e

TRANSPARÊNCIA BRASIL, associação sem fins lucrativos fundada em 2000, destinada a promover a defesa do interesse público por meio da edificação da integridade do Estado brasileiro e o combate à corrupção, contribuindo para o aperfeiçoamento das instituições e do processo democrático, neste ato representada por seu diretor-executivo

dirigem-se, respeitosamente, a Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5, inciso XXXIV, alínea a, da Constituição Federal, para requerer providências com respeito à publicidade das prestações de contas dos partidos políticos a esse egrégio Tribunal, pelas razões de fato e direito a seguir aduzidas. Ver post completo “Carta à Ministra Rosa Weber solicita a publicação dos extratos bancários dos partidos em tempo real”

[Coluna 25]: Dados pessoais e monitoramento de redes sociais pelo governo de São Paulo

Em 25 de janeiro deste ano, o governo do estado de São Paulo publicou um edital de licitação de R$ 15 milhões para contratação de serviço de comunicação que inclui o monitoramento de redes sociais e veículos on-line. Uma das entregas é descrita como “[p]rincipais influenciadores (detratores e apoiadores) em fichas individualizadas” (p. 40).

O edital solicita também o monitoramento de temas mais mencionados por usuários, a classificação dos comentários de acordo com o sentimento que expressam (neutros, positivos ou negativos), entre outros. Esse tipo de política, que tem se tornado cada vez mais comum, suscita vários questionamentos de ordem ética e legal que deveriam ser feitos, especialmente à luz da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

A LGPD é importante neste caso porque regula o tratamento de dados pessoais realizado em território nacional, tanto por parte do setor público, quanto da iniciativa privada. O monitoramento de comentários em redes sociais e a produção de fichas individualizadas, entre outros, envolvem tratamento de dados pessoais.

A primeira questão, portanto, é: até que ponto os comentários de cidadãos em redes sociais e veículos on-line são dados pessoais passíveis de proteção pela LGPD? O artigo 4º da Lei apresenta as exceções para a sua aplicação: os tratamentos de dados para fins jornalísticos, e exclusivamente para fins de segurança pública, defesa nacional, segurança do estado ou atividades de repressão e investigação penal. Ver post completo “[Coluna 25]: Dados pessoais e monitoramento de redes sociais pelo governo de São Paulo”

[Coluna 24] Erros na interpretação do Índice de Percepção da Corrupção

A Transparência Internacional divulgou seu Índice de Percepção da Corrupção (IPC) de 2019. É um dos índices mais conhecidos e utilizados no mundo para comparar a corrupção entre países. Ao chamar a atenção para um problema sério como a corrupção e, no caso do Brasil, mostrar como estamos abaixo no ranking deles, contribui para redobrar os esforços para enfrentar esse problema sério.

Não por outro motivo, jornais usuários nas redes sociais não demoraram a divulgar e interpretar o índice como se ele mensurasse, de fato, a corrupção real. A própria Transparência Internacional, em divulgação via Whatsapp, caracterizou o índice como sendo uma “avaliação do nível de corrupção no setor público”. Nesta coluna, discuto em mais detalhes até onde o IPC pode ser usado corretamente, e quais seus limites e problemas.

 

Percepção eurocêntrica

Comecemos pelo óbvio. Um índice de percepção mede apenas a percepção de um fenômeno, não o fenômeno em si. Na verdade, o IPC é resultado da média de várias medidas distintas, produzidas em diferentes contextos e algumas mais objetivas que outras. Porém, como o IPC não utiliza a metodologia estatística adequada para agregar esses indicadores diversos, o resultado final acaba sendo apenas um índice de percepção de corrupção. Ver post completo “[Coluna 24] Erros na interpretação do Índice de Percepção da Corrupção”

Newsletter – Janeiro de 2020

A newsletter da Transparência Brasil tem periodicidade mensal e você também pode recebê-la no seu e-mail assim que ela fica pronta, inscrevendo-se aqui.

Nas edições regulares, ela traz informes sobre as atividades da Transparência Brasil e informações relevantes sobre os temas de transparência, controle social, integridade outras notícias que foram destaque no mês.

Mas em janeiro de 2020 preparamos uma edição especial sobre o nosso Relatório de Atividades de 2019 . Acesse a edição completa da newsletter neste link .

[Coluna 20] Em defesa dos partidos políticos

Na última segunda-feira, dia 09/12, participei de audiência pública no Supremo Tribunal Federal sobre candidaturas avulsas. Na oportunidade, fiz exposição contrária à possibilidade de candidaturas independentes. Nesta coluna, segue uma versão do que falei na audiência.

A Transparência Brasil é contra as candidaturas avulsas, por três razões: em primeiro lugar, não irá ajudar a aumentar a pluralidade de vozes representadas em nossa democracia, podendo mesmo até agravar a situação atual; em segundo lugar, porque partidos são importantes e precisam ser fortalecidos, não enfraquecidos. Por fim, permitir candidatura avulsa é estimular uma solução simplista: em vez de ir na raiz dos problemas optamos por soluções que apenas tornam a situação mais complexa e com novas complicações.

Candidaturas avulsas sem recursos públicos

Proponho que analisemos a questão das candidaturas avulsas em dois cenários hipotéticos. No primeiro cenário, temos que as candidaturas avulsas serão permitidas, mas todo o restante continuará como antes, do ponto de vista institucional. Na arena eleitoral, candidatos avulsos não terão direito a algo equivalente ao fundo partidário, nem ao fundo eleitoral. Terão tempo ínfimo no horário eleitoral gratuito da rádio e da TV. E terão de ser eleitos com mais votos do que os candidatos de partidos, pois devem ultrapassar, sozinhos, o quociente eleitoral.

Uma vez eleitos, situação similar ocorrerá na arena legislativa. O regimento interno das casas continuará a privilegiar partidos. Assim, eleitos avulsos terão peso ínfimo nos blocos parlamentares – que determinam, como sabemos, a composição das mesas e comissões permanentes; não terão o poder de pedir urgência na tramitação de projetos de lei, nem poderão usufruir dos demais poderes concedidos aos líderes partidários. Ver post completo “[Coluna 20] Em defesa dos partidos políticos”

Participação da Transparência Brasil no evento ‘Em Frente pela Democracia’.

No dia 02 de dezembro, foi realizado o evento Em frente pela Democracia, organizado pelo Pacto pela Democracia, e que contou com a participação de ativistas, pesquisadores e lideranças de variadas esferas e matizes políticos para refletir sobre os rumos da democracia e fortalecer o compromisso de todas e todos com a defesa das liberdades e do Estado de Direito. Segue abaixo a íntegra da contribuição da diretora de operações da Transparência Brasil, Juliana Sakai:


Há tantos problemas urgentes de ataque a sociedade civil, que poderia unir coro aos colegas que trataram aqui da diminuição e criminalização ao ataque do espaço cívico. Mas para ficar na área de atuação da Transparência Brasil, de combate a corrupção, meu ponto será: 

Contra moralismo, instituições.

Contra punitivismo, prevenção.


Nós temos um enorme problema para lidar na política brasileira, que é o fato de a corrupção ter se tornado um elemento que ameaça a democracia. Eu não estou falando de como a corrupção prejudica o acesso a bem estar social por desvio de verbas. Estou falando de como a pauta anticorrupção vem aliada ao sentimento antipartido, antipolítica e, por consequência, antidemocracia.

Após tantos escândalos de corrupção, o desgaste político surfou numa onda populista autoritária, deixando que a pauta anticorrupção fosse capturada por grupos que não têm compromisso com a democracia.  Ver post completo “Participação da Transparência Brasil no evento ‘Em Frente pela Democracia’.”

[Coluna 19] Opacidade como estratégia: análise do “revisaço” de normas pelo governo federal

Ao fim do dia 28 de novembro, o governo federal publicou no Diário Oficial da União o Decreto nº 10.139/2019, que obriga a revisão de todos os atos normativos inferiores a decretos em um prazo de 18 meses. O que a princípio parece ser apenas mais um ato administrativo sem grande importância pode, na verdade, ter graves efeitos sobre toda a estrutura federal.

O decreto obriga órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional a revisar e consolidar todos atos normativos inferiores a decretos atualmente em vigor. Em outras palavras, portarias, resoluções, avisos, instruções normativas, ofícios, orientações, diretrizes, entre outros, serão revisados e poderão ter sua redação modificada, ser fundidos com outros atos administrativos ou até ser revogados.

Simplificar é bom, e não há dúvida de que há uma série de normas muito antigas, potencialmente gerando problemas, e que necessitam de revisão. Segundo nota à imprensa divulgada, o governo justifica que a medida reduziria o custo Brasil em até R$ 200 bilhões, pois transformaria o aparato regulatório brasileiro em algo eficaz. Ver post completo “[Coluna 19] Opacidade como estratégia: análise do “revisaço” de normas pelo governo federal”