Licença-compensatória custou R$ 819 mi ao Judiciário em 16 meses e deve ser prioridade para limitar supersalários

Criada sem amparo legal para driblar o teto constitucional, a licença-compensatória já custou pelo menos R$ 819 milhões ao Judiciário em 16 meses, revela análise do DadosJusBr, projeto da Transparência Brasil que obtém, compila e disponibiliza as remunerações. Magistrados que receberam a verba tiveram aumento nos contracheques de, em média, R$ 12,4 mil ao mês.

A licença-compensatória se tornou um dos principais penduricalhos do sistema de Justiça. Em vez de solucionar o problema, o PL dos Supersalários (Projeto de Lei nº 2721/2021), aprovado pela Câmara dos Deputados e sob análise pelo Senado, legaliza o seu pagamento acima do teto, agravando o estrangulamento do orçamento do Judiciário e Ministério Público.

Licença-compensatória, penduricalho recém-criado, custou R$ 819 milhões ao Judiciário em 16 meses

Identificada em 35 tribunais de Justiça, a licença-compensatória transforma a gratificação por exercício cumulativo em um dia de folga para cada três trabalhados, que pode ser convertido em pagamento. A manobra permite que a verba seja caracterizada como indenizatória, ficando isenta do teto do  funcionalismo público, que não pode ultrapassar o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal – atualmente de R$ 44 mil.

Para criar o benefício, os Conselhos Nacionais do Judiciário e Ministério Público utilizaram o princípio de simetria entre carreiras. Em dez.2023, a TB revelou que o drible ao teto constitucional culminou no aumento de até ⅓ das remunerações dos magistrados.  

Em 19 meses, três em cada cinco magistrados (59%) dos 35 tribunais analisados receberam a licença-compensatória. Ao menos 4,2 mil magistrados foram agraciados com mais de R$ 100 mil pela verba. O maior gasto com o penduricalho foi identificado no TJ-PR: R$ 157,3 milhões entre set.2023 a out.2024.

O levantamento é subnotificado por problemas de transparência nos dados divulgados pelos tribunais ao Painel de Remuneração do Conselho Nacional de Justiça, onde o DadosJusBr coleta os contracheques. Apesar disso, mantendo-se o ritmo atual, a licença-compensatória devidamente identificada e rastreada ultrapassará a marca de R$ 1 bilhão em janeiro de 2025.

TB denuncia ilegalidade do penduricalho

Em out.2024, a Transparência Brasil denunciou a ilegalidade da licença-compensatória ao Tribunal de Contas da União (TCU), defendendo que os atos administrativos que a criaram fossem declarados irregulares e os pagamentos suspensos. A corte arquivou a denúncia sob a justificativa de já haver procedimento aberto em 2022 para analisar as resoluções que instituíram a verba no MP e Judiciário.

Como formas de limitar os supersalários no sistema de Justiça, a organização pede celeridade do TCU na análise dos procedimentos abertos. Além disso, a TB recomenda que o governo federal estabeleça expressamente o caráter remuneratório da gratificação por exercício cumulativo e similares na Proposta de Emenda à Constituição 45/2024, não permitindo brechas para o seu desvirtuamento e pagamento acima do teto constitucional.