Nota: PEC 05/2021 impõe retrocesso ao combalido sistema anticorrupção brasileiro

A Transparência Brasil vem a público manifestar sua preocupação com a possibilidade de aprovação do substitutivo ao Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 05/21, de autoria do deputado Paulo Magalhães (PSD/BA).

A pretexto de melhorar a accountability do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) – demanda importante – o novo texto proposto e que pode ser votado já na próxima terça-feira (19.out.2021) traz inúmeras ameaças à independência do Ministério Público (MP), em particular nas investigações de políticos.

O retrocesso maior está na redação do art. 130-A, §3º-F, que diz: “O Conselho Nacional do Ministério Público poderá desconstituir atos administrativos que constituam violações do dever funcional dos membros após a devida apuração em procedimento disciplinar, preservada a independência funcional e assegurada a apreciação judicial” (grifos nossos).

Após críticas de membros do Ministério Público e de organizações da sociedade civil como a própria Transparência Brasil, o relator do substitutivo ressalvou que apenas atos administrativos poderiam ser desfeitos pelo CNMP e que seria preservada a independência funcional. Ocorre que os atos legais dos membros do Ministério Público (como, por exemplo, um acordo de delação premiada) são considerados atos administrativos, justamente porque não são nem atos legislativos nem jurídicos (restritos ao Judiciário). Assim, a despeito de se falar em preservar independência funcional, abre-se brecha para interpretação de que o CNMP terá poder para anular atos pertinentes à atividade-fim dos membros do MP.

Esta possível interpretação é agravada pela ampliação dos poderes das Casas do Congresso de indicar membros para compor o CNMP. A Transparência Brasil defende que o órgão de controle do MP precisa ser mais aberto e responsivo à sociedade, para que seja efetivamente um órgão de controle externo. Contudo, a redação proposta, que permite a indicação de cidadãos externos à carreira com reputação ilibada e notável saber jurídico (inciso VII do art. 130-A), é uma brecha para pessoas não comprometidas com a coisa pública terem poder sobre os atos fins dos membros do MP.

Sem uma regulamentação adequada e rigorosa do que significa reputação ilibada e notável saber jurídico, há grandes possibilidades de pessoas serem indicadas com o propósito explícito de cercear a independência do MP, especialmente em casos de corrupção envolvendo políticos. Uma prova concreta é o fato de que a reputação ilibada também é uma exigência legal para a nomeação de Conselheiros dos Tribunais de Contas mas, conforme relatórios da Transparência Brasil demonstram, é completamente ineficaz para vedar que investigados e condenados possam ser indicados pelos Legislativos e assumir esses cargos em órgãos de controle.

A matéria é importante e requer cuidado e atenção aos detalhes para que o aperfeiçoamento da responsividade do Ministério Público possa ser conduzida a contento. E não houve, até o momento, uma única audiência em que quem trabalha com controle social tenha sido convidado a participar das discussões. É mister ouvir não apenas os membros dos órgãos afetados, mas a própria sociedade civil organizada, para que a reforma possa alcançar o fim desejado.

Assim, a Transparência Brasil solicita aos Deputados e Deputadas Federais que não desperdicem oportunidade de aperfeiçoar os sistemas de controle do MP com mais um retrocesso ao combalido sistema anticorrupção brasileiro.

Transparência Brasil, 18 de outubro de 2021.