Comissão do governo federal falha em monitorar aplicação de sigilos sobre informações

Levantamento inédito da Transparência Brasil revela que a Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI) não cumpre com suas atribuições estabelecidas pela Lei de Acesso à Informação (LAI). O colegiado deveria ter uma lista completa das informações que foram classificadas como secretas e ultrassecretas pelo Executivo federal, mas sua base de dados contém 1.971 registros a menos do que o total contabilizado nas listas de sigilos divulgadas por órgãos ministeriais.

Quando uma informação é colocada em sigilo no grau secreto ou ultrassecreto por um órgão público federal, ela deve ser encaminhada à CMRI por meio do Termo de Classificação de Informações (TCIs), que indica a origem, o grau de sigilo e o prazo da restrição de acesso àquela informação. 

De acordo com o estudo da TB, a CMRI tem um sistema tecnológico defasado e não adota procedimentos para verificar se está recebendo todos os TCIs. A discrepância entre os dados da Comissão e dos órgãos pode ser muito maior: além de apresentarem uma quantidade de sigilos divergentes, um cruzamento item a item das duas bases indica 8.729 sigilos que não estão na base da CMRI, e 5.369 informações classificadas que só estão presentes na base da Comissão e não aparecem nos portais dos órgãos ministeriais. 

O cruzamento das bases evidenciou problemas nos dados sobre classificação de informações, como falta de padronização, erros de preenchimento e omissões. Como resultado, não é possível saber ao certo quantas informações foram classificadas como secretas e ultrassecretas no governo federal.

A CMRI também descumpre sua atribuição de rever a cada quatro anos a classificação das informações como secretas ou ultrassecretas. Ao menos 19.520 termos de sigilo sob custódia da CMRI referem-se a informações produzidas há quatro anos, sendo que foram realizadas apenas 1.149 reavaliações desde 2012, segundo balanço de 2022 do órgão. 

Se a classificação não for revisada a cada quatro anos pelo colegido, o sigilo perde, automaticamente, a sua validade. Ou seja, as mais de 19 mil informações na base da CMRI classificadas como secretas e ultrassecretas antes de jan.2020 e que não foram submetidas à revisão deveriam perder a validade. Isso também se aplica para os sigilos de antes de jan.2020 não revisados e que não estão sob custódia do colegiado.

Em 2017, a Comissão editou uma portaria delegando aos ministros de Estado o trabalho de reanálise das classificações em grau secreto, contrariando o decreto que regulamenta a LAI no governo federal (que não estabelece a possibilidade dessa delegação). A portaria não define como os órgãos ministeriais devem realizar e prestar contas dessa função, tampouco como a CMRI deve fiscalizar seu cumprimento.

As falhas da CMRI resultam em um cenário no qual não há acompanhamento de eventuais abusos da imposição de sigilo, nem da possível reversão deles. Por outro lado, isso gera uma insegurança jurídica sobre informações que acertadamente estão classificadas como secretas e ultrassecretas mas, por não terem sido analisadas pelo colegiado no prazo de quatro anos de sua classificação, são consideradas automaticamente desclassificadas.

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