Em 2016, a Transparência Brasil levou ao Conselho de Transparência da Administração Pública do estado de São Paulo relatório da Ponte Jornalismo, “Informação Encarcerada: A Blindagem de Dados na Segurança Pública de São Paulo”, cobrando do Conselho explicações para a falta de transparência dos órgãos de Segurança. A Secretaria de Segurança Pública (SSP), a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) e a Fundação Casa foram chamadas para prestar esclarecimentos ao Conselho, e percebendo a diferença da política de transparência entre os três órgãos, bem como as demandas por fim de opacidade de informações da área, o Conselho de Transparência decidiu pela criação do Grupo de Trabalho (GT) Transparência e Segurança de forma a permitir discussões aprofundadas sobre acesso a informações relacionadas à segurança pública.
Criado no segundo semestre de 2016, o GT reuniu-se mensalmente até novembro de 2017. Além dos três órgãos da Segurança, participaram representantes da Ouvidoria-Geral do estado de São Paulo, Arquivo Público do estado de São Paulo, Procuradoria-Geral do estado, Transparência Brasil e entidades convidadas, como Artigo 19, Instituto Sou da Paz e Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
A avaliação da Transparência Brasil, em consonância com as outras organizações da sociedade civil, é a de que os 15 meses de reuniões com órgãos estatais foram positivos primordialmente pelo canal de comunicação que se estabeleceu entre estado e sociedade civil permitindo um debate direto, e a consequente possibilidade de se encontrar consensos sobre melhorias no acesso à informações de segurança.
Com efeito, o GT foi produtivo no tocante ao debate sobre dados pessoais, primeiro eixo do GT que englobava tópicos como publicidade dos boletins de ocorrência (BO), informações sobre mortes, dados da população custodiada, processos de apuração e disciplinares. Definiu-se consenso em relação a procedimento para histórico de BOs, informação cujo acesso exige assinatura de termo de responsabilidade. O debate sobre informações da população custodiada permitiu evidenciar a urgência de organizar e publicar ativamente os dados da SAP, tendo sido sugerida a inclusão de dados como orçamento da Secretaria, custos dos presos, faixa etária, etnia, presos estrangeiros, gastos com escolta, população carcerária total, número de presos, número de delitos. Sobre processos disciplinares, foi recomendada uma série de procedimentos aceitáveis para a administração, como a publicização ativa de estatísticas sobre apuração, punição e absolvição, de forma a respeitar a proteção de dados pessoais quando a legislação assim exija.
Já quanto ao segundo eixo sobre sigilo, os órgãos de segurança, particularmente a SSP, mostraram-se infelizmente bastante resistentes, impedindo que houvesse avanço na discussão, a despeito da discordância dos representantes das organizações da sociedade civil. A alegação dos órgãos era de que não haveria como debater a questão do sigilo já que se trata de dados sigilosos, ao que a sociedade civil contra-argumentou que haveria possibilidade de conduzir a discussão uma vez que não precisaríamos de acesso ao conteúdo sigiloso, mas sim de acesso aos metadados, isto é, informações a respeito das informações sigilosas, notadamente a motivação sobre o sigilo, sem necessidade de abordar casos concretos. Os órgãos do estado de São Paulo mantiveram seu posicionamento de que tal discussão seria ilegal. Criou-se uma situação kafkiana, em que o estado pode definir o que é sigiloso, sem revelar à sociedade os motivos do sigilo, impossibilitando que seja questionado e controlado. Com isso, o GT foi finalizado.
Ao ser apresentada ao Conselho de Transparência a motivação da recusa de abordar questões de sigilo por parte dos órgãos de segurança, houve consternação entre alguns conselheiros tanto do estado, quanto da sociedade civil. A despeito disso, infelizmente não foi feita nenhuma recomendação por parte do Conselho que tenha gerado uma forma concreta de lidar com os metadados de informação classificada. Os órgãos da sociedade civil reuniram-se com o Ouvidor-Geral do Estado solicitando a continuidade do GT e importância de manter um canal aberto de diálogo, mas infelizmente não houve até o momento indicação de qualquer encaminhamento neste sentido.