Novo levantamento da Transparência Brasil a partir de dados disponibilizados pelo DadosJusBr mostra que pelo menos 1.534 membros dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) da 1ª a 5ª Região e suas seções judiciárias tiveram remunerações acima do teto constitucional de janeiro a junho de 2023. Desses membros, que somam ativos e inativos, 44% receberam ‘supersalários’ em mais de um mês no período; dois deles em todos os seis meses.
No total, foram 2.399 casos de supersalário no período (dados). O TRF-4 foi o órgão em que se identificou a maior quantidade de casos: 760, somando membros das 1ª e 2ª instâncias. Um de seus desembargadores recebeu R$ 426,6 mil em janeiro – o equivalente a 10 vezes mais do que o teto constitucional, atualmente em R$ 41.650,92.
A composição da remuneração desse desembargador ilustra o motivo de haver ‘supersalários’: 86% correspondem a indenização de férias. Trata-se do pagamento por férias vencidas e não gozadas, um direito que não é contabilizado no total que deve sofrer desconto para que o recebimento fique dentro do limite. Indenizações de férias custaram aos TRFs R$ 11,9 milhões entre janeiro e junho deste ano.
A indenização de férias não é o único direito ou benefício livre dos descontos, o chamado mecanismo de abate-teto. Ela é parte de um grupo de pagamentos considerados “indenizatórios” por resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e dos Tribunais de Justiça. Em teoria, cobrem gastos que têm relação com o cargo. Mas a realidade é outra: ao serem classificadas dessa maneira, as verbas viram “extras” que escapam do teto e são as responsáveis por turbinar os contracheques em milhares de reais.
Apenas pagamentos classificados como “remuneratórios”, como o próprio salário dos magistrados, adicionais por tempo de serviço e ajudas de custo para capacitação profissional sofrem descontos do abate-teto.
Comparativo entre os valores do teto constitucional e a média salarial de cada TRF da 1ª a 5ª Região entre janeiro e junho de 2023
Os dados organizados e publicados pelo DadosJusBr são extraídos do Painel de Remunerações do CNJ. O projeto é financiado pelo Instituto Betty e Jacob Lafer.
Dados imprecisos e falta de transparência
Observa-se a existência de ao menos 40 benefícios diferentes nos cinco TRFs e respectivas seções judiciárias. A grande variedade de verbas pagas dificulta saber quais devem se submeter ao abate-teto ou não.
A ausência de dados no Painel, apesar de os órgãos serem obrigados a fornecê-los, e dados errados também comprometem o controle social completo sobre as remunerações no Judiciário. Não é possível saber o que são dois benefícios pagos a membros dos tribunais federais da 2ª a 5ª Região, pois estão identificados como ‘0’ e ‘-’. As verbas somam R$ 10,3 milhões nos primeiros seis meses de 2023.
O TRF-6, em funcionamento desde agosto de 2022, não disponibiliza os dados ao CNJ para o Painel de Remunerações, descumprindo a Portaria nº 63, de 17 de agosto de 2017 do Conselho. No portal do tribunal, apenas dois dos 12 meses disponíveis apresentam contracheques de todos os desembargadores; quanto aos juízes de 1º grau, os dados não estão disponíveis para download em formato aberto, sendo necessária a raspagem dos dados para análise.