Servidores públicos é o tema mais frequente em pedidos de informação

Por Renata Galf e Hugo Salustiano

Desde que a Lei de Acesso à Informação (LAI) entrou em vigor, em 2012, os brasileiros ganharam ferramentas e prazos para obter do governo informações que não estejam disponíveis publicamente.

E o que os cidadãos vêm perguntando ao poder público? Um levantamento da ONG Transparência Brasil mapeou quais são os assuntos mais solicitados: eles vão de salários de servidores públicos à tramitação de projetos de lei.

Dados sobre servidores públicos são os mais requisitados, segundo o relatório. O assunto aparece entre os três mais pedidos em 88% dos órgãos analisados, sendo que, em um terço deles, foi o assunto campeão.

Dos três poderes, o Judiciário é o que mais teve pedidos sobre servidores: 37% dos pedidos do poder foram sobre esse assunto, contra 17% do Executivo e 14% do Legislativo. Nesses pedidos, há desde requisições sobre salários de servidores e benefícios como auxílio-moradia e alimentação até, sobre faltas e votos de ministros ou deputados.

Com uso de aprendizado de máquina e classificação manual, a Transparência Brasil analisou mais de dez mil pedidos de acesso à informação recebidos pelo Executivo Federal e por outros 33 órgãos das diferentes esferas de poder e níveis federativos entre 2012 e 2017. A própria amostra de pedidos do estudo foi obtida via LAI.

Apesar de ser um tema muito pedido pelos cidadãos, o estudo constatou que ainda se encontra muita dificuldade para obter os salários de funcionários de muitos órgãos da administração pública direta e indireta.

Mesmo após decisão de 2012 do Supremo Tribunal Federal ter reconhecido o interesse público dessas informações, declarando que não publicá-las estaria em desarcordo com a legislação, muitos órgãos ainda se recusam a divulgá-las, alegando por exemplo caráter pessoal da informação.

Outro assunto que está entre os mais perguntados em todos os poderes foi concursos públicos. Nota-se, em muitos dos pedidos, que foram enviados por pessoas que estão efetivamente participando dos processos seletivos. As perguntas abordam desde critério de escolha da comissão avaliadora, número de vagas a serem preenchidas nos órgãos, cargos disponíveis e previsão de data da publicação do edital.

Nos pedidos sobre políticas públicas feitos ao Executivo, o principal tema perguntado foi sobre trânsito e mobilidade (7% dos pedidos), com solicitações sobre linhas de ônibus, acidentes, multas e até quilômetros de congestionamento. Outros temas de política pública bastante procurados foram saúde e saneamento e educação (respondendo, cada um, por 5% do total de pedidos do Executivo).

Entender qual tipo de informação vem sendo solicitado e respondido via LAI é fundamental para avaliar se esta lei pode ser considerada uma ferramenta de fortalecimento do controle social ou se tem servido para suprir outras demandas por transparência no país.

Outro problema recorrente foi o uso da justificativa de “trabalho adicional” pelos órgãos para negar atendimento a diversos pedidos. Quantidade de processos de corrupção abertos e julgados na última década, assim como do número de condenados são dois exemplos de pedidos de informação negados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) com base no argumento de “trabalho adicional”.

É impossível que toda a informação pública esteja disponível em portais de transparência. Mas se dados frequentemente solicitados não estão propriamente divulgados, além de desrespeitar a LAI, mais tempo e dinheiro da máquina pública são gastos para que múltiplos pedidos sejam individualmente atendidos.

É importante que órgãos públicos passem a disponibilizar todos os pedidos recebidos e suas respostas diretamente em seus portais. Isso já acontece em alguns órgãos, como a Controladoria-Geral da União. Além de diminuir a quantidade de pedidos de informação duplicados, isso permitiria a qualquer um identificar quais órgãos estão ou não cumprindo a LAI.

Linguagem clara

Muitos pedidos via Lei de Acesso à Informação dizem respeito a dados que já são públicos, mas que os requerentes não conseguem encontrar. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, apesar de o processo de tramitação já estar disponibilizado no portal do órgão, “tramitação” representou sozinha 35% dos pedidos.

Para a Transparência Brasil, o alto índice é consequência da linguagem complicada e técnica com que a informação é disponibilizada. De acordo com a LAI, é dever do Estado garantir acesso à informação de forma “transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão”.

Com mais de dez tipos de tipos de proposição legislativa existentes no site, ainda que o usuário consiga encontrar a que deseja, não é fácil — principalmente para o público não especializado — identificar em qual fase da tramitação uma proposta está ou o que significa determinada etapa. Além disso, os textos contêm muitos termos técnicos e rebuscados, dificultando o entendimento.

Entre os pedidos do Judiciário, o problema da linguagem é ainda mais grave, segundo o estudo. Acostumados a lidar com a letra da lei, processos, juristas, advogados e magistrados, os operadores deste poder responsáveis por responder pedidos de LAI parecem muitas vezes se esquecer que estão escrevendo para cidadãos não-especialistas.

Um exemplo aconteceu em um pedido em que um tribunal respondeu que uma solicitação “encontra óbice na falta de indicação de uma [sic] limite temporal”. Na prática, o tribunal queria dizer que o solicitante não havia delimitado o espaço de tempo sobre o qual queria as informações (isto é, dados de 2005 a 2010, por exemplo).

Assim, embora a LAI tenha sido um grande avanço na transparência dos órgãos públicos brasileiros, ainda há muitos obstáculos para que o direito constitucional de acesso à informação seja plenamento cumprido nos diversos níveis do poder público.