Newsletter – Junho de 2019

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Além dos informes das atividades da Transparência Brasil, nossa newsletter também traz informações relevantes sobre os temas de transparência, controle social, integridade outras notícias que foram destaque no mês. Acesse a edição completa .

Destaques de Junho:

  • Evento Repasses federais em educação: transparência e controle social em municípios do projeto Obra Transparente;
  • coluna semanal do Manoel Galdino;
  • lições institucionais das revelações do Intercept Brasil sobre a Lava Jato;
  • Primeira tipologia para temas de solicitações baseadas na Lei de Acesso a Informação no Brasil

9 medidas para reestruturar o programa Proinfância e dar mais efetividade para construção de creches e escolas

Opinião do Diretor-executivo

A partir desta semana, nosso diretor-executivo, Manoel Galdino, publicará uma análise semanal (toda sexta-feira) sobre temas de interesse da Transparência Brasil. Este conteúdo será exclusivo para os associados da Transparência Brasil, mas abriremos esta primeira edição para todos os assinantes da nossa newsletter. Para quem não é associado, as colunas semanais serão disponibilizadas na newsletter seguinte. Saiba como se tornar um associado neste link.

9 medidas para reestruturar o programa Proinfância e dar mais efetividade para construção de creches e escolas.

No dia 11/06 a Transparência Brasil em parceria com o Observatório Social do Brasil realizou seminário para discutir o programa Proinfância [1] do governo federal. Muitos problemas do Proinfância foram abordados, mas também conseguimos pensar em várias soluções para reestruturar o programa e trazer mais efetividade para essa importante política pública. Para se ter uma ideia de sua baixa eficácia, segundo dados da CGU, menos de 20% das quase 9 mil obras de creches e pré-escola previstas estão em funcionamento. Abaixo seguem nossas recomendações para o poder público e órgãos de controle:

  1. Ampliar a transparência do FNDE. Muitas informações básicas do Proinfância ainda não são públicas ou não são bem explicadas. Atualmente não é possível saber com certeza quanto cada obra recebeu de recurso, já que os dados são agrupados por convênio e não por obra. Não há dados de todo o processo licitatório em formato aberto. Aqui, recomendamos que se adote as recomendações da Open Contracting Partnership [2], para que o controle social possa ser mais efetivo.
  2. Durante o seminário, os órgãos públicos reconheceram a incapacidade de analisar milhares de prestações de contas manualmente. O governo deveria investir na utilização de algoritmos de aprendizagem de máquina, para processar todos esses dados e identificar potenciais fraudes ou problemas. Órgãos de auditoria federais já dispõem de experiências positivas no uso de inteligência artificial para fortalecer o controle, de modo que a extensão dessa prática é relativamente fácil.   
  3. Difundir e estender boas práticas das contratações do Governo Federal para o nível municipal. Um exemplo seria fomentar a adesão dos municípios ao Portal de Compras utilizado pelo Governo Federal (Comprasnet) [3], ou até mesmo torná-la obrigatória para licitações que envolvem recursos federais. Isso poderia ser uma alternativa para, no curto prazo, ampliar a publicidade e a transparência desses procedimentos, promover mais competitividade e facilitar tanto o controle social como o controle externo.
  4. Que o FNDE faça parcerias com o organizações da sociedade civil que trabalham com controle social, como a Transparência Brasil e os Observatórios Sociais. Dada a incapacidade do governo federal para fiscalizar todos os municípios conveniados, parcerias para estimular e fortalecer o controle social podem complementar o trabalho de monitoramento do órgão. Lembrando que CGU, TCU e MPF já possuem acordos de cooperação com a Transparência Brasil, mas não o FNDE.
  5. Transparência fiscal. Muitas prefeituras reclamam no atraso de repasses e o cidadão não sabe quem responsabilizar pelo atraso em uma obra. Assim, é importantíssimo que o FNDE disponibilize informações atualizadas sobre o cronograma de repasses previstos para cada obra, eventuais atrasos em sua implementação, o orçamento previsto para o ano (e os demais anos do Plano Plurianual – PPA), bem como o que está sendo de fato transferido.
  6. Muitos recursos já foram transferidos para os municípios cujas obras se encontram paralisadas, abandonadas ou canceladas. Portanto, encontram-se sem possibilidade de uso. O MPF e FNDE advogaram por medidas que permitam que esses recursos, em vez de serem devolvidos para o caixa único do Tesouro Nacional, sejam obrigatoriamente gastos com educação, preferencialmente para viabilizar a continuidade da construção de outras obras do Proinfância que correm risco de paralisação devido à falta de recursos.
  7. Uma das maiores dificuldades do Proinfância é a falta de capacidade técnica de muitas prefeituras – seja na fase de planejamento da obra, processo licitatório, fiscalização do contrato ou recebimento da obra. Assim, é fundamental que além do recurso financeiro, seja ofertada essa capacitação para os servidores municipais, de forma que se minimizem os problemas atuais que afetam as várias etapas da construção de creches e escolas.
  8. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios, há elevado interesse das prefeituras em retomar obras inacabadas. Porém, a resolução n. 3 de 2018, voltada para resolver esse problema, teve pouca adesão. Assim, sugerimos rever os termos da resolução e ampliar sua divulgação.
  9. Cumprimento pelo FNDE e MEC das medidas recomendadas pela CGU [5], já que até o momento apenas 9 de um total de 44 foram adotadas pelo FNDE, e 0 de 8 pelo MEC.

Essa agenda de medidas passará a fazer parte das recomendações da Transparência Brasil e serão encaminhadas aos órgãos de controle, FNDE, representantes dos municípios e congressistas interessados no tema. A maioria das propostas, se implementadas, teria impacto positivo não apenas sobre o Proinfância, mas também sobre outros programas federais da educação e de outras áreas relevantes.

 

Manoel Galdino
Diretor-executivo da Transparência Brasil

[1] O Proinfância, programa instituído em 2007 pelo Governo Federal, tem como principal objetivo prestar assistência financeira, em caráter suplementar, ao Distrito Federal e aos municípios que firmarem convênio com o FNDE. Os recursos do Proinfância destinam-se à construção, reforma e aquisição de equipamentos e mobiliários para creches e pré-escolas públicas.

[2] A Open Contracting Partnership (OCP), ou Parceria para Contratos Abertos, é uma iniciativa que visa promover a adoção de padrões de dados abertos para contratos, que podem ser adotados por qualquer governo. Organizações da sociedade civil podem monitorar de forma fácil em que medida o padrão foi adotado ou não. Descrições para os padrões recomendados podem ser encontradas aqui.

[3] O Comprasnet é um portal de compras públicas do governo federal. É um sistema único para as operações de compras públicas de todos os órgãos da Administração Pública Federal, incluindo a divulgação e realização das licitações, registros dos contratos, além da catalogação de materiais e serviços e do cadastro unificado de fornecedores.  

[4]  A CGU, como órgão de controle interno do executivo federal, realiza periodicamente avaliações e auditorias de programas do governo federal. E estes relatórios geram recomendações aos órgãos, que podem se encontradas em três relatório da CGU: aqui, aqui e aqui. A CGU informou durante o seminário de 11/06 quantas dessas medidas foram implementadas pelo FNDE e MEC até o momento.

Falhas estruturais do Proinfância são discutidas por governo, órgãos de controle e sociedade civil em evento da Transparência Brasil

 

 

Após dois anos de monitoramento cidadão projeto apresenta relatório sobre falhas encontradas em todas as fases do programa.

Junho de 2019

O programa Proinfância, do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE), precisa de alterações urgentes. Este foi o consenso entre representantes do governo, de órgãos de controle e da sociedade civil que participaram do evento Repasses federais em educação: transparência e controle social em municípios do projeto Obra Transparente, ocorrido no dia 11 de junho.

O evento marcou dois anos do projeto Obra Transparente, implementado pela Transparência Brasil em parceria com o Observatório Social do Brasil (OSB) e 21 observatórios sociais locais, que ofereceu capacitações e assessoria técnica para o monitoramento cidadão de obras de escolas e creches financiadas pelo governo federal.

Com foco propositivo, o evento foi dividido em duas partes: durante a manhã, convidou  gestores municipais e observadores sociais que participaram do projeto a discutirem formas de fortalecer a gestão local e o monitoramento social sobre repasses federais; na parte da tarde, aberto ao público geral, apresentou os principais resultados e descobertas do projeto e promoveu um debate a respeito do programa monitorado.

Perspectivas para o controle social em nível local

Na primeira atividade, uma dinâmica entre os participantes estimulou a apresentação de propostas para aprimorar a efetividade do controle social. Com reconhecida experiência no tema, Luciana Pascarelli, da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento de São Paulo, Bruna Santos, diretora de conhecimento e inovação da ONG Comunitas e conselheira da Transparência Brasil, e Roni Enara, diretora-executiva do OSB, iniciaram as falas com provocações aos demais participantes.

As palestrantes apresentaram instrumentos e discutiram estratégias para o acompanhamento e fiscalização dos governos no nível local, e foram sucedidas por relatos de cooperação e enfrentamento de dificuldades tanto pelos observadores quanto pelos gestores públicos presentes. Entre as experiências abordadas, Adriano Strassburger, contou como o uso do drone de um dos demais observadores sociais de sua cidade, Lajeado (RS), permitiu a retomada de uma obra que precisava de uma foto aérea para liberar seu financiamento.

Fortalecimento da sociedade civil no controle social e da gestão local na implementação de políticas federais

Em seguida, observadores sociais e gestores públicos foram divididos em salas separadas para debater os obstáculos identificados pelo projeto e apresentar as sugestões para superá-los.

Entre os gestores, as principais queixas referiam-se a dificuldade de alterar o projeto básico das obras, que quando padronizado nem sempre se adequa às necessidades específicas dos municípios, e ao desafio de planejar sem orçamento.

Para sanar essas dificuldades, os gestores gostariam que os municípios recebessem os repasses para gerir suas obras com mais autonomia. Outro ponto levantado foi a necessidade de qualificação dos servidores responsáveis pelas licitações e pela fiscalização das obras.

Já entre os integrantes dos Observatórios Sociais, a discussão trouxe um grave problema de transparência: a disparidade entre a situação das obras e os dados disponíveis no portal do governo. As restrições de acesso às instalações e a falta de preparo de alguns servidores para a fiscalização das obras também foram queixas recorrentes entre os grupos.

As contribuições dos observadores para superar esses obstáculos se concentraram no uso de instrumentos de planejamento como o Programa de Metas, estímulo a parcerias com entidades de classe de engenheiros e arquitetos que possam auxiliar com conhecimento técnico no monitoramento de obras e o uso de mecanismos para garantir o comprometimento das construtoras mesmo após a entrega da obra.

Painel de apresentação dos percursos e resultados dos projetos Tá de Pé e Obra Transparente

Aberta ao público geral, a parte da tarde do evento se iniciou com a celebração da 2ª colocação do projeto Obra Transparente no Prêmio República, na categoria Responsabilidade Social, concedida pela Associação Nacional dos Procuradores da República.

Em seguida, no primeiro painel do dia, Manoel Galdino, diretor-executivo da Transparência Brasil, apresentou resultados da avaliação de impacto do aplicativo de celular Tá de Pé, que permite aos cidadãos fiscalizarem obras de creches escolas por meio de fotos.

Segundo Manoel, apesar do número modesto de alertas enviados a partir das fotografias de cidadãos, esse exercício foi capaz de aumentar 5% a chance das obras serem concluídas. Em ação paralela ao aplicativo, a Transparência Brasil enviou alertas aos governos subnacionais baseados apenas em inconsistência de dados oficiais, sem evidências fotográficas. Embora a iniciativa tenha aumentado significativamente o volume de respostas recebidas dos órgãos públicos, não teve impacto na conclusão de obras .

Logo após, Bianca Vaz Mondo, gerente do projeto Obra Transparente, falou sobre as experiências e avaliações elaboradas nos dois anos de exercício do controle social sobre 135 obras de 21 municípios participantes, que resultaram no relatório Proinfância ou Problema na Infância? Os desafios na construção de creches e escolas em municípios brasileiros, lançado na ocasião do evento.  

Em sua fala, Bianca apontou, fase a fase, uma série de falhas estruturais no programa que só serão solucionadas com reformulação. A gerente do Obra Transparente iniciou seu relato sobre as graves irregularidades no Proinfância tratando de casos que seriam identificados ainda na fase de planejamento “em que obras receberam financiamento sem cumprir os requisitos mínimos para sua implementação, segurando recursos que seriam importantes para custear obras melhor planejadas”.

Bianca ainda citou fragilidades na condução dos processos de licitação e contratação por parte dos entes federados na fase de execução e obras entregues com a segurança comprometida por  falhas na execução, em consequência de uma fiscalização inadequada.

Balanço da política de repasses para infraestrutura escolar: o que funciona e quais os desafios?

No último painel, a Transparência Brasil conseguiu juntar governo, órgãos de controle e representante dos municípios para apresentarem seus diagnósticos do Proinfância. 

 O FNDE, que nos últimos dois anos se mostrou relutante em dialogar e cooperar com a Transparência Brasil, enviou dois representantes para um diálogo franco. A coordenadora-geral de Infraestrutura Educacional, Patrícia Costa, e o coordenador-geral de Implementação e Monitoramento de Projetos Educacionais, Olímpio Soares, reconheceram os problemas do programa e apresentaram as diferentes estratégias que o Ministério da Educação já formulou para o Proinfância. O governo reconheceu a importância do controle social para monitorar a implementação da política pública e se comprometeu a receber as organizações da sociedade civil.

Recordando que o investimento em educação nos primeiros anos de vida trazem os maiores retornos para a sociedade, o coordenador do Núcleo de Ações de Prevenção da Corrupção da Controladoria Regional da União no Estado de São Paulo, Márcio Aurélio Sobral, afirmou que “os erros do Proinfância não podem diminuir a relevância da demanda por creches nos municípios do país”.

Márcio também apresentou dados de monitoramentos da Controladoria-Geral da União, que resultou em cancelamentos de obras mal planejadas. A estimativa do prejuízo causado por obras inacabadas, canceladas e paralisadas já chega a R$ 830 milhões.

Em seguida, Mônica Cardoso, técnica da área de educação da Confederação Nacional dos Municípios, falou sobre a dificuldade de se retomar as obras inacabadas do Proinfância.  Segundo Mônica, a Resolução 03/2018, que busca firmar novos termos de compromisso entre os entes federados e o FNDE para a conclusão dessas obras, não conseguiu a estimular a adesão dos municípios. 

Com base em uma pesquisa realizada pela CNM, Mônica destacou o interesse dos municípios na recuperação de contratos pendentes para concluir as obras que não se concretizaram. Mas advertiu que o prazo definido pela resolução não será suficiente para a regularização e sugeriu uma ação conjunta com o FNDE para ampliar a compreensão dos motivos para a não conclusão das obras.

Dando concretude à discussão, a Procuradora da República no Estado do Rio de Janeiro, Maria Cristina Manella, reproduziu um vídeo que documenta visitas do Grupo de Trabalho de Educação do Ministério Público Federal a duas escolas construídas com recursos do Proinfância em um município do Estado de Alagoas, uma em más condições de conservação e outra concluída, mas sem uso por conta da troca de gestão responsável pela obra.

Além destes casos, Maria Cristina abordou com ênfase os problemas da segunda fase do Proinfância, encerrado em 2015, mas que ainda tem reflexos negativos. Para a procuradora, por utilizar projetos muito específicos, o programa ficou refém dos quatro fornecedores capazes de executá-los, que abandonaram contratos deixando obras inacabadas sem a possibilidade de recuperação. Assim, Maria Cristina recomenda que seja adotada a metodologia convencional nos contratos a serem reativados pela Resolução 03/2018.

Que lições institucionais podemos tirar das revelações do Intercept Brasil sobre a lava-jato?

Uma das inovações institucionais dos últimos 15 anos no combate à corrupção foi a criação de forças tarefas, envolvendo vários órgãos de controle. Não apenas polícia e MP, mas receita federal, COAF etc. trabalhando juntos.

Outra inovação foi a criação, em 2003, pelo judiciário, de varas especializadas em lavagem de dinheiro, justamente o caso da 13ª vara federal de Curitiba, da qual Sérgio Moro foi titular até o ano passado.

Essas varas foram criadas justamente pela complexidade de crime financeiro e de lavagem de dinheiro. É muito difícil investigar esse tipo de crime – e também, de corrupção – e por isso o próprio judiciário entendeu a necessidade de uma vara especializada.

Nesse sentido, o juiz deve ter compreensão do quebra-cabeça desses crimes para poder não apenas julgar bem, mas autorizar adequadamente o que for necessário para que o MP e polícia possam fazer seu trabalho.

É natural, portanto, que um juiz desse tipo trabalho em colaboração estreita com o MP. Vale lembrar, a esse respeito, por exemplo, como se deu a operação Castelo de Areia (sobre esta operação, veja o que escreveu a ex-diretora executiva da @trbrasil: https://natpaiva.wordpress.com/2015/04/15/as-ruas-tem-memoria-impeachment-temer-e-a-operacao-castelo-de-areia/).

A Castelo de Areia descobriu que as grandes construtoras estavam envolvidas em esquemas de corrupção, envolvendo pelo menos sete partidos políticos: PSDB, DEM, PPS, PMDB, PSB, PDT e PP, tendo como centro a construtora Camargo Corrêa.

A operação, porém, foi anulada no STJ, porque as quebras de sigilo autorizadas pelo Juiz Fausto de Sanctis tiveram por base denúncia anônima. O que alegou a Polícia Federal e o MP? Que eles verificaram a idoneidade da denúncia anônima.

Ora, isso só é possível se você puder garantir ao juiz de primeira instância que você sabe quem é o denunciante, ainda que não possa colocar no papel, por quaisquer razão (por exemplo, garantir segurança da denunciante).

Em outras palavras, provavelmente havia colaboração informal entre os membros da operação Castelo de Areia e o Juiz Fausto de Sanctis. De fato, é muito difícil imaginar que uma operação de tamanha complexidade não tenha a colaboração bastante próxima de um juiz especializado.

Crimes desse tipo requerem que o juiz forme uma opinião antecipada sobre a provável culpa, para que sejam autorizadas tamanhas supressões de direitos como quebra de sigilo por 14 meses (Castelo de Areira) ou prisões preventivas de mais de ano (lava-jato).

Assim, tanto MP quanto juiz de primeira instância tendem a ver como natural esse tipo de colaboração, pela característica mesmo da complexidade do crime e do potencial de impacto.

Agir formando opinião independente sobre culpabilidade para cada pedido de quebra de sigilo, condução coercitiva, apreensões e prisão preventiva e temporária tornaria inviável investigar e punir crimes tão complexos e grandes.

Neste modelo, a repressão ao crime é o principal objetivo da justiça penal – com máximo de velocidade e finalidade. Poderes policiais devem ser expandidos para investigar, prender, buscar e condenar criminosos.

O processo penal deveria se assemelhar a uma fábrica, com os casos se movendo em direção à sua conclusão e, se a polícia faz uma prisão e o promotor faz uma acusação formal, deve haver presunção de culpa, pois o trabalho deles é altamente confiável.

Essa visão reflete aquilo que o estudioso do direito americano Packer chamou de “modelo judicial de controle de crime”.  Como contraposição a esse modelo, Packer apresentou o modelo do devido processo legal.

Suas características seriam: a principal função da justiça penal deve ser preservar o devido processo legal ou imparcialidade perante a lei; poderes policiais devem ser limitados, para evitar a opressão do indivíduo.

O processo penal deve ser pensado como uma corrida de obstáculo, consistindo de uma série de salvaguardas legais para impedir que um inocente seja condenado injustamente; uma pessoa só deve ser condenada se houver provas coletadas de acordo com a lei.

Moro e Dallagnol não apenas trabalham com o modelo de controle do crime, mas também têm buscado ativamente mudar as leis brasileiras para que este seja o modelo predominante, bastando para isso ver as dez medidas contra corrupção do MP e o pacote anti-crime de Moro.

Ocorre que nossa legislação, especialmente após a Constituição Federal de 88 é predominantemente garantista, isto é, adota o modelo do devido processo legal. Nesse sentido, as leis brasileiras impõem limitações ao tipo de conduta adotados pelo MP e Moro na lava-jato.

Não apenas isso, mas o sucesso da operação lava-jato, como sabiam Moro e Dallagnol, depende de apoio popular para evitar que a operação seja anulada. Acusações de partidarismo nesse tipo de operação são comuns e preservar a imagem e confiança de que a justiça é imparcial é fundamental.

Não por acaso o magistrado italiano Gherardo Colombo, que atuou na operação Mãos limpas, chamou a atenção para um problema institucional brasileiro (https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,nao-ha-na-italia-o-sistema-da-delacao-premiada,70002045111). Segundo ele:

Existe uma diferença notável [entre Brasil e Itália] sobre o perfil do controle dos magistrados. Na Itália existe o MP, que faz a investigação. Existe o juiz da investigação preliminar, q controla a atividade do MP e que emite todos os procedimentos que restringem em qualquer medida a liberdade como a custódia cautelar na cadeia, as interceptações telefônicas e por aí vai. Quando a investigação termina, um outro juiz, um juiz para a audiência preliminar, decide se vai mandar a julgamento o investigado ou mesmo se recusa a abertura do processo.

Mas aquele que faz a investigação pode, em alguma medida, ser influenciado por aquilo que descobriu, tanto que, na Itália, o juiz que decide não pode conhecer o conteúdo dos atos processuais senão por meio do debate no tribunal.

Então, institucionalmente o Brasil não criou essa separação entre quem instrui o processo e quem vai emitir a sentença. E isso permite que o juiz forme presunção de culpa antes mesmo do julgamento.

E, enamorado por suas teses, e colaborando de forma próxima com o MP, Moro acabou por exceder completamente o papel de juiz e, conforme as conversas reveladas pelo Intercept (supondo que são verdadeiras), acabou com qualquer vestígio de imparcialidade

E, em um caso tão importante como a lava-jato, e ainda mais sabendo do histórico das operações anteriores que foram anuladas, cometer tal ato revela não apenas irresponsabilidade, mas húbris.

A crença de que está acima da lei e da ética, de que não pode fazer nada errado. Em certo sentido, parece-me, se assemelha ao Lula, que se considera a pessoa mais honesta do Brasil. Essa auto-imagem engrandecida de si mesmo não permitiu a eles verem seus erros.

Do ponto de vista institucional, a lição que o Brasil precisa tirar é que é urgente rever essa ausência de separação entre o juiz que autoriza e coordena investigação e aquele que sentencia. É assim em vários países do mundo e faz parte da boa prática da justiça.

Que nem Moro no seu pacote de reforma criminal, nem o MP nas 10 medidas anti-corrupção tenham mencionado isso mostra como eles não entenderam o tamanho do problema de como funciona essa parte da justiça no Brasil.

Os avanços na construção de um país mais íntegro não podem depender apenas de pessoas extremamente éticas e coisas dos seus deveres. Precisamos de instituições que fechem as janelas de oportunidade para malfeitos.

Há um provérbio alemão (que talvez tenha origem na Rússia) que diz: Vertrauen ist gut, Kontrolle ist besser! “confiança é bom. Controle é melhor!”. Precisamos adotar esse provérbio aqui no Brasil.

Repasses federais em educação: transparência e controle social em municípios do projeto Obra Transparente

Desde 2017, a Transparência Brasil e o Observatório Social do Brasil realizam o projeto Obra Transparente, um trabalho conjunto de controle social sobre as obras de creches e escolas do programa Proinfância do FNDE (Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação).

Baseado no treinamento de observadores para monitoria de obras técnicas em 21 cidades do país, oferecendo assessoria técnica e promovendo a troca de experiências entre os participantes, o projeto fez apontamentos alarmantes: das 135 obras que os participantes monitoraram, 55 (40,7%) foram canceladas!

No próximo dia 11 de junho, o evento “Repasses federais em educação: transparência e controle social em municípios do projeto Obra Transparente” vai apresentar os desafios e recomendações acumuladas pelos participantes durante dois anos de monitoramento cidadão sobre obras do ProInfância.

Além disso, teremos ainda um balanço da política de repasses federais para custear infraestrutura escolar, com representantes da Controladoria Geral da União, Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação, Confederação Nacional dos Municípios e Ministério Público Federal. Para participar, é necessário inscrever-se previamente pelo formulário disponível neste link. Um e-mail confirmará sua inscrição.

Agenda: 

Data: 11 de junho (terça-feira)

Horário: das 14h às 17h

Local: ESPM Tech

Endereço: Rua Joaquim Távora, 1240, Vila Mariana, São Paulo

Programação:

14h – 15h15 Painel 1 – Apresentação dos percursos e resultados dos projetos Tá de Pé e Obra Transparente
Manoel Galdino e Bianca Vaz Mondo (Transparência Brasil)

15h15 – 16h45 Painel 2 – Balanço da política de repasses para infraestrutura escolar: o que funciona e quais os desafios?
Patrícia Carneiro Costa (FNDE)
Márcio Aurélio Sobral (CGU)
Mariza Abreu (CNM)
Maria Cristina Manella Cordeiro (MPF/PRRJ)

16h45 – 17h Conclusão
Ney da Nóbrega Ribas (Observatório Social do Brasil)

17h Encerramento

Inscreva-se: http://bit.ly/inscrevaseot