Pandemia foi usada para negar atendimento a pedidos de informação mesmo após suspensão da MP 928

A pandemia de Covid-19 foi citada injustificadamente como motivo para negativa de atendimento a pelo menos 24 pedidos de informação feitos ao Executivo federal de 27 de março a 27 de abril – depois, portanto, de o Supremo Tribunal Federal (STF) suspender liminarmente trechos da Medida Provisória (MP) 928/2020. Em 30 de abril, o plenário do STF confirmou a liminar e derrubou o texto, que possibilitava a interrupção do prazo para respostas via Lei de Acesso a Informação (LAI) por causa do estado de emergência decretado no país.

O levantamento foi feito pelo Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, coalizão de organizações da sociedade civil e pesquisadores que monitora a implementação da LAI. Foram consideradas respostas contendo os termos “covid” e/ou “coronavírus” fornecidas no período localizados via busca no banco de pedidos e respostas da Controladoria-Geral da União (CGU).

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Em 37% dessas respostas, o Ministério da Saúde negou acesso a alguns dados e informações sobre a pandemia sob a alegação de que os materiais precisam “ser salvaguardados” por sua importância estratégica. Descumprindo a LAI, não apontou se as informações estão classificados em algum grau de sigilo nem quem teria sido responsável por classificar o documento. Uma das solicitações buscava o procedimento adotado pelo poder público para decretar o estado de emergência.

As negativas de atendimento compõem a maioria (52%) entre os casos nos quais o atendimento a pedidos no governo federal foi alterado sob justificativas genéricas relacionadas à pandemia.

Respostas parciais representam 22% das mudanças de atendimento sem fundamento sólido contabilizadas no período. Em uma delas, a Universidade Federal de Rondônia (UNIR) citou indevidamente a MP 928 como justificativa para fornecer apenas parte da informação solicitada.

Não atendimento: a resposta indicou que não era possível enviar a informação solicitada
Atendimento com alteração de procedimento: a resposta indicou que a informação seria enviada fora do e-SIC, por e-mail
Atendimento parcial: parte da informação foi enviada; a resposta indicou que o restante não poderia ser enviado
Extensão de prazo por tempo definido: a resposta indicou que haveria “demora maior do que o normal” para o atendimento e apontou uma data dentro do prazo legal para o envio das informações

 

Entre as justificativas, predominaram a mera menção à pandemia e a adoção de teletrabalho, sem detalhamento sobre como interfeririam no atendimento à demanda.

As respostas têm origem em 15 órgãos distintos. A maior parte (24%) veio do Ministério da Saúde, seguido pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sergipe (IFSE) e IBGE, com 18% cada.

Em 12% dos 34 casos em que o pedido não foi atendido ou foi atendido parcialmente, a resposta foi alterada para atendido após apresentação de recurso.

Efeito da MP 928

No curto prazo em que o texto esteve em vigor, 13 pedidos foram afetados por ele. Sete pedidos deixaram de ser plenamente atendidos sob a justificativa da pandemia e, segundo resposta da CGU a um pedido de informação, seis tiveram o prazo de atendimento suspenso com base na medida. Após a suspensão da MP pelo STF, estes últimos voltaram a tramitar e foram atendidos total ou parcialmente.

Atendimentos alterados após suspensão da MP 928 com fundamentação sólida

De 27 de março a 27 de abril, 95 pedidos tiveram o atendimento justificadamente alterado por causa da pandemia. A maioria (66%) não foi atendida (a resposta indicou que não era possível fornecer as informações por causa da emergência e detalhou os motivos); 22% foram atendidos parcialmente (foi enviada apenas parte das informações e foram detalhados os motivos para a impossibilidade de enviar o restante).

Não atendimento: a resposta indicou que não era possível enviar a informação solicitada
Atendimento parcial: parte da informação foi enviada; a resposta indicou que o restante não poderia ser enviado
Extensão de prazo por tempo definido além do permitido pela LAI: a resposta indicou que o pedido seria atendido em uma data específica, que ultrapassava o número de dias permitido pela LAI
Extensão de prazo por tempo definido: a resposta indicou que haveria “demora maior do que o normal” para o atendimento e apontou uma data dentro do prazo legal para o envio das informações
Atendimento fora do prazo: a resposta foi enviada após o final do prazo permitido pela LAI
Atendimento com alteração de procedimento: a resposta indicou que a informação seria enviada fora do e-SIC, por e-mail

 

Dentre as fundamentações para alteração no atendimento a pedidos, a mais frequente (43%) foi a necessidade demonstrada da presença de um servidor no órgão público para consultar e enviar a informação solicitada. Excluindo-se casos em que os pedidos buscavam documentos históricos ou de projetos de obras, estas ocorrências indicam a existência de gargalos na modernização e digitalização de informações em órgãos federais, especialmente nas universidades, que concentram 41% das negativas de atendimento ou atendimento parcial com esse argumento.

A segunda justificativa mais frequente (32%) foi a dependência de servidores envolvidos diretamente em ações relacionadas à pandemia. A maioria destes casos (21 respostas) foi apresentada pelo Ministério da Saúde, nos quais se revelou a existência do ofício circular Nº 3/2020/DLOG/SE/MS, segundo o qual o Departamento de Logística pode deixar de atender a uma solicitação por estar imerso em ações relacionadas à Covid-19.