Na coluna anterior, discuti as causas de tantas obras paralisadas. Em audiência pública na Câmara dos Deputados em 28 de agosto, que discutiu o acórdão 1079/2019 do TCU sobre obras paralisadas, procurei me concentrar em apresentar soluções para este problema. O que segue é uma versão editada da minha fala na Câmara dos Deputados.
O princípio orientador destas propostas se fundamenta em uma nova concepção de como fazer política pública no Brasil. São necessárias muita experimentação e avaliação de resultados para que possamos aprender quais intervenções funcionam, quais possuem maior impacto e quais têm melhor custo-benefício. Não se pretende ter todas as respostas para a questão da paralisação de obras públicas, mas oferecer um plano de hipóteses que podem ser testadas e avaliadas. Decerto, ajustes serão necessários com o passar do tempo.
Propostas
1) Os órgãos de controle – especialmente os Tribunais de Contas estaduais – não responsabilizam adequadamente os gestores municipais. Para corrigir a falha, propomos:
1.1) Promulgar emenda à Constituição modificando o objetivo dos Tribunais de Contas, com ênfase na avaliação de políticas públicas, em vez do controle de legalidade.
1.2) Alterar a Lei de Acesso a Informação, para que determine explicitamente que o trabalho dos auditores seja público, e, excepcionalmente, protegido pelo sigilo.
1.3) Regulamentar com critérios objetivos o que significa reputação ilibada, idoneidade moral e notório saber, no contexto da nomeação de conselheiros e ministros dos Tribunais de Contas, com regras rigorosas para nomeação, tomando como exemplos a da Lei das Estatais e a Lei da Ficha Limpa.
2) A Lei de Responsabilidade Fiscal impede a inclusão de novos projetos na lei orçamentária sem que antes sejam concluídos os que estão em andamento.
2.1) É preciso regulamentar o artigo 45 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que limita a inclusão de novos projetos na lei orçamentária antes de serem concluídos aqueles que estão em andamento. Segundo o já referido acórdão do TCU, seriam necessários pelo menos R$ 130 bilhões para complementar as obras paralisadas, sem considerar as que não estão paralisadas. Sem recursos suficientes, é preciso regulamentar ou modificar a lei, para que se dê ao menos transparência efetiva sobre quais obras terão de fato recursos e quais continuarão paralisadas.
2.2) A Lei Orçamentária Anual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e o Plano Plurianual deverão incluir lista de todas as obras que serão executadas no respectivo período fiscal, o fluxo de pagamento previsto de cada obra e o valor desses pagamentos. Devem ainda fixar um teto para o custo global das obras – a soma de recursos disponíveis, já considerando as metas fiscais. Além disso, contingenciamentos determinados pelo Executivo para cumprimento de meta fiscal devem indicar obrigatoriamente quais obras serão afetadas.
3) Aprovar uma lei nacional de dados abertos, instaurando o padrão de dados abertos para toda a administração pública em todos os níveis e poderes, bem como legislação específica de contratos abertos. Para o caso de obras públicas, deverá ser obrigatório disponibilizar em transparência ativa pelo menos as seguintes informações: i) projeto básico de cada obra, individualizando cada um dos elementos do projeto básico, nomeando-os de acordo com a orientação técnica do Instituto Brasileiro de Auditoria de Obra Pública – IBRAOP; ii) cronograma físico-financeiro de cada obra; iii) boletim de medição da obra, com defasagem máxima de atualização especificada; e iv) todos os contratos associados à obra.
4) Criação pelo Congresso Nacional, e em caráter emergencial, de uma Matriz de Impacto para priorização de retomada de obras paralisadas. A Matriz de Impacto deve conter, pelo menos: tempo estimado para conclusão, percentual de execução, recursos necessários para conclusão e grau de impacto socioeconômico e ambiental da obra. A matriz deverá orientar a retomada de obras com sua inclusão em lei orçamentária.
5) Alterar o PPA 2020-2023, a LDO-2020 e a LOA-2020 para que prevejam os recursos para cada obra custeada pelo Governo Federal, bem como fluxo de pagamento. O levantamento do TCU serve de parâmetro para que se estabeleça um planejamento orçamentário para essas 38 mil obras nos próximos quatro anos e oferece critérios para remanejamento de recursos entre obras, com base em matriz de risco.
Estas propostas, obviamente, estão longe de esgotar o assunto. Nem todas as soluções dependem de alterações legislativas, mas acredito que servem como um bom caminho para testar hipóteses e começar a mitigar o problema.
Manoel Galdino
Diretor-executivo da Transparência Brasil