Na última segunda-feira (15.mar.2021), reportagem da BBC Brasil revelou que a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) criou um grupo permanente de monitoramento de retrocessos no combate à corrupção no Brasil. De acordo com o texto, trata-se de uma medida inédita. Convém lembrar que se trata do resultado de um processo já iniciado em 2019.
Antes, cabe um breve histórico: o Brasil ratificou em 2000 a Convenção da OCDE Anti-Suborno no Exterior. Resumidamente, o instrumento obriga os Estados parte a tornar crime o pagamento de propina para agentes públicos no exterior. Os Estados também aceitaram o monitoramento da implementação da Convenção e suas recomendações, de acordo com a orientação do Grupo de Trabalho da OCDE sobre Suborno.
Ao longo dos anos, o Brasil melhorou suas legislações e iniciativas de combate à corrupção no exterior, conforme pode ser verificado pelos relatórios de monitoramento do Grupo de Trabalho. O último relatório publicado é de 2017 e, embora apontasse pendências, reconhecia avanços do país, como a regulamentação e implementação da Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) e a aplicação de sanções.
Em 2019, no entanto, a OCDE percebeu um declínio na implementação de medidas anticorrupção e emitiu uma declaração pública demonstrando preocupação com a possível aprovação da Lei de Abuso de Autoridade. Com a concretização da possibilidade, a organização fez uma visita ao Brasil ao final daquele ano e publicou nova declaração, criticando a legislação por ser vaga e ampla demais, e as decisões do então presidente do STF, Dias Toffoli, de interromper as investigações feitas com base em relatórios do COAF/UIF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras/Unidade de Inteligência Financeira) sem autorização judicial prévia.
Na reunião de dezembro de 2019 do Grupo de Trabalho sobre Suborno, decidiu-se que, se não ocorresse progresso suficiente nas questões levantadas ou novas questões surgissem até junho do ano seguinte, outras medidas poderiam ser tomadas, sem especificar quais. Em junho e em outubro de 2020, o governo brasileiro teve de explicar como estava enfrentando as questões apontadas. Precisou, ainda, esclarecer ao grupo as alegações feitas em abril pelo então ministro da Justiça Sergio Moro de interferência política na Polícia Federal.
Em sua última reunião de 2020, em dezembro, o GT sobre Suborno decidiu estabelecer um subgrupo de monitoramento para “continuar a acompanhar as questões apontadas” após a visita realizada em 2019 – conforme noticiou a BBC Brasil na reportagem mencionada inicialmente.
Desde então, o GT da OCDE se reuniu mais uma vez entre os dias 8 e 12 de março, mas o resumo da reunião ainda não foi publicado. Não está claro, portanto, se há uma decisão mais recente a respeito do subgrupo (como, por exemplo, se ele será permanente, como cita a reportagem). De todo modo, claramente o Brasil não está conseguindo tranquilizar a OCDE sobre o que está fazendo para enfrentar os problemas que têm surgido no combate à corrupção no país.
As novas propostas de mudanças em legislações relevantes, como a Lei de Lavagem de Dinheiro e a chamada PEC da Impunidade são potencialmente violadoras da Convenção da OCDE da qual o Brasil é um dos Estados parte. O próximo relatório sobre o Brasil está previsto apenas para 2022 e a OCDE parece querer fazer pressão antecipadamente, de forma a tentar evitar que o relatório seja sobre mais retrocessos realizados, e possa abordar também avanços e pelo menos manutenção do status quo nestas legislações ameaçadas.