Carta aberta ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em oposição ao PL nº 5.029/2019 (antigo PL nº 11.021-B/2018)

Brasília, 18 de setembro de 2019.

 

A Sua Excelência o Senhor
RODRIGO FELINTO IBARRA EPITÁCIO MAIA
Presidente da Câmara dos Deputados
Praça dos Três Poderes – CEP 70165-900
Brasília/DF

 

Excelentíssimo Senhor Presidente,

As entidades signatárias celebraram na data de ontem (17/09) a rejeição pelo Senado Federal de todos os retrocessos para transparência e integridade dos partidos políticos e das campanhas eleitorais constantes do Projeto de Lei (PL) 5.029/2019.

Consideram, portanto, que a apreciação desta matéria na Câmara dos Deputados a partir da presente data constitui uma oportunidade singular para que se avance nos mecanismos de promoção da integridade e da transparência no sistema político brasileiro.

Nesse sentido, é especialmente relevante o aprimoramento do Sistema de Prestação de Contas Anuais (SPCA), implementado pela Justiça Eleitoral em 2017, para o adequado cumprimento do que se prevê no inciso III do artigo 17 da Constituição Federal [1], e que – a exemplo do Portal da Transparência [2]– pode constituir-se em eficiente meio de acompanhamento pela sociedade da contabilidade de suas agremiações políticas.

A implementação do SPCA representou o primeiro passo em termos de aprimoramento da transparência pública e da eficiência nos processos de auditoria das contas dos partidos e o PL 5.029/2019 retrocede nesse esforço ao permitir a utilização de qualquer sistema de gestão contábil para prestação das contas partidárias ao órgão de controle [3]. Esse conjunto de informações deixará, portanto, de ser padronizado, o que dificultará sobremaneira o controle social das contas dos partidos e o processo de análise e julgamento desses balanços pela Justiça Eleitoral.

De igual modo, deve-se dar o mesmo tratamento aos sistemas de acompanhamento das contas das campanhas eleitorais. A legislação deve, portanto, tornar mais transparentes e eficazes o Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE) e o DivulgaCand, ferramentas eletrônicas da Justiça Eleitoral desenvolvidas para divulgação das contas dos candidatos durante as campanhas, garantindo que as informações neles inseridas sejam sempre atuais e fidedignas. O PL 5.029/2019 caminha na contramão dessa diretriz ao prever a impossibilidade de cominação de qualquer sanção ao partido ou candidato que insira dados incorretos nos sistemas de informação e publicação de contas de campanhas [4].Essa previsão pode, na prática, revelar-se verdadeira autorização para lançamento de dados falsos nesses sistemas, que se demonstraram fundamentais nas últimas eleições para detecção tempestiva pela imprensa das assim chamadas “candidaturas laranja”.

No mais, causa profunda repulsa a autorização para pagamento de honorários advocatícios para defesa de políticos acusados de corrupção e para patrocínio de processos de “interesse indireto” do partido com recursos públicos [5]. O custeio de despesas dessa natureza pelo cidadão ofende as intensas e insistentes demandas da sociedade brasileira por mais rigor no emprego do dinheiro público e por mais ética na política.

No mesmo sentido, é igualmente inquietante e nocivo que despesas com contadores e advogados para defesa de candidatos e partidos sejam excluídas da contabilidade partidária e do limite de gastos nominal das campanhas políticas [6]. Ao lado da permissão para que pessoas físicas possam arcar com despesas de campanha com advogados e contadores sem qualquer limitação de valor [7], essa previsão abre ampla margem para práticas de caixa-dois e lavagem de dinheiro.

Ademais, também se considera reprovável a determinação de que multas por desaprovação de contas partidárias apenas sejam aplicadas caso se comprove conduta dolosa [8]. Além de introduzir elemento de dificílima verificação em atividades de contabilidade, que demandará complexas diligências para produção de prova, tal previsão pode significar verdadeira anistia a todas as prestações de contas ainda pendentes de julgamento, dado que a exigência de comprovação de conduta dolosa seria aplicável a todos os processos de prestação de contas partidárias que não tenham transitado em julgado em todas as instâncias [9].

A promoção da integridade do sistema partidário brasileiro fica ainda comprometida por outras medidas previstas no PL 5.029/2019, como a diminuição da autonomia dos técnicos responsáveis pela análise das contas partidárias [10]; a exclusão das contas bancárias dos partidos das políticas de controle de pessoas politicamente expostas [11]; a possibilidade de transferência de recursos do Fundo Partidário para instituto privado inalcançado, à princípio, pelos órgãos de controle [12]; e a permissão para pagamento de passagem aérea com recurso do Fundo Partidário para qualquer pessoa, inclusive não filiados [13].

Outros dispositivos do PL 5.029/2019 seguem a mesma lógica de atomização de responsabilidades, diminuição de obrigações e suavização de penalidades, que dá a tônica das alterações realizadas na legislação partidária das últimas duas décadas. Nesse sentido, a proposta retira encargos dos partidos ao mesmo tempo em que adiciona competências à já sobrecarregada Justiça Eleitoral, que passa a ser responsável pela gestão dos dados de filiados [14]; fica impedida de solicitar aos partidos documentos públicos ou emitidos por entidade bancária [15]; e obrigada a notificar a instância superior para aplicar penalidade ao diretório municipal ou estadual [16]. Na mesma trilha, o texto flexibiliza ainda mais o pagamento das multas aplicadas aos partidos, ao limitar os descontos que a Justiça Eleitoral pode fazer nos repasses do Fundo Partidário a no máximo 50% do valor devido, diminuindo sua capacidade de promover o esmero na gestão dos recursos públicos transferidos aos partidos e inibir a reiteração de condutas irregulares [17].

Não se ignora, Sr. Presidente a necessidade de garantir recursos para as campanhas eleitorais de 2020 e o texto aprovado no Senado Federal em 17/09 já considera tal imperativo.

Em suma, caso a Câmara dos Deputados venha a contemplar o conjunto de alterações ora denunciados, a proposta poderá representar um dos maiores retrocessos dos últimos anos para transparência e integridade do sistema partidário brasileiro.

Alterações dessa natureza são especialmente sensíveis e conformam oportunidade ímpar para que se reafirme o comprometimento com o processo legislativo democrático e aberto à participação social, porquanto interessam diretamente aos detentores de mandatos parlamentares.

Sensível às demandas da sociedade e aos apontamentos das entidades que estudam e trabalham por mais transparência e integridade na política e no poder público, o Senado Federal rejeitou os retrocessos que a proposta poderia provocar.

Certas de seu inarredável compromisso com os imperativos democráticos de transparência e integridade, as entidades signatárias decidem tornar pública a presente correspondência e exortam Vossa Excelência a valer-se desta oportunidade para avançar no desenvolvimento de um marco regulatório que promova mais e melhores mecanismos de transparência e prevenção de irregularidades nos partidos políticos e nas campanhas eleitorais.

Excelentíssimo Presidente Deputado Rodrigo Maia, o Brasil precisa de partidos pautados em honestidade, transparência e boa gestão dos recursos públicos para o fortalecimento da democracia e desenvolvimento do país. O resgate da legitimação social dos partidos é requisito fundamental não só para o pleno exercício da cidadania, mas também para a resolução de nossos dilemas e iniquidades e para o aprofundamento da democracia no Brasil. Alcançar os objetivos da Constituição — construir uma sociedade livre e solidária, reduzir as desigualdades e eliminar todas as formas de discriminação — será muito mais lento e custoso sem partidos políticos transparentes, coerentes, íntegros e democráticos.

Nesta oportunidade, renovam-se protestos de estima e consideração.

Respeitosamente,

TRANSPARÊNCIA PARTIDÁRIA

ASSOCIAÇÃO CONTAS ABERTAS

TRANSPARÊNCIA BRASIL

UNIDOS CONTRA A CORRUPÇÃO

INSTITUTO NÃO ACEITO CORRUPÇÃO

INSTITUTO ETHOS DE EMPRESAS E RESPONSABILIDADE SOCIAL

INSTITUTO OBSERVATÓRIO POLÍTICO E SOCIOAMBIENTAL

INSTITUTO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE

INSTITUTO CIDADE DEMOCRÁTICA

ARTIGO 19

RENOVA BR

MOVIMENTO ACREDITO

MOVIMENTO LIVRES

MOVIMENTO AGORA

OBSERVATÓRIO SOCIAL DE BRASÍLIA

OBSERVATÓRIO SOCIAL DE BELÉM

INSTITUTO SOMA BRASIL

INSTITUTO NOSSA ILHÉUS

ASSOCIAÇÃO AMIGOS DE ANALÂNDIA – SÃO PAULO

MOVIMENTO POPULAR DESPERTA IBIAPINA – CEARÁ

SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS DE IBIAPINA – CEARÁ

PRATA VIVA EDUCAÇÃO AMBIENTAL – ÁGUAS DA PRATA – SÃO PAULO

 

Referências:

[1] Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: (…) III – prestação de contas à Justiça Eleitoral;
[2] http://www.portaltransparencia.gov.br/
[3] Art. 30 da Lei 9.096/95.
[4] §2º do Art. 30 da Lei 9.504/97.
[5] Inciso VII do Art. 44 da Lei 9.096/95. Ademais, provoca apreensão a possibilidade de que despesas com ações judiciais de controle de constitucionalidade possam ser custeadas pelo Fundo Partidário, estimulando a judicialização da política com recursos públicos (art. §10 do Art. 37 da Lei 9.096/95).
[6] Parágrafo Único do Art. 18-A da Lei 9.504/97.
[7] §10 do Art. 23 da Lei 9.504/97.
[8] §16 do Art. 37 da Lei 9.096/95.
[9] Art. 6º do PL 5.029/2019.
[10] §5º do Art. 34 da Lei 9.504/97.
[11] §7º do Art. 39 da Lei 9.096/95.
[12] Inciso V do Art. 44 da Lei 9.096/95.
[13] §10 do Art. 37 da Lei 9.096/95.
[14] Art. 19, caput, e §4º da Lei 9.096/95.
[15] §6º do Art. 34 da Lei 9.096/95.
[16] §3º-A do Art. 37 da Lei 9.096/95.
[17] §3º do Art. 37 da Lei 9.096/95.

Newsletter – setembro de 2019

Confira a edição de setembro da newsletter da Transparência Brasil. Ela tem periodicidade mensal e você também pode recebê-la no seu e-mail assim que ela fica pronta, inscrevendo-se aqui.

Além dos informes das atividades da Transparência Brasil, nossa newsletter também traz informações relevantes sobre os temas de transparência, controle social, integridade outras notícias que foram destaque no mês. Acesse a edição completa .

Destaques de setembro:

  • Resultados do projeto de monitoramento de obras públicas apresentadas no 3º Congresso Pacto pelo Brasil;
  • Propostas para superação dos problemas estruturais das obras públicas inacabadas ;
  • A Carta apresentada pela Transparência Brasil, a Transparência Partidária e outras entidades da sociedade civil contra o PL da Improbidade Partidária;
  • Colunas semanais do Manoel Galdino.

Carta aberta conjunta de organizações em oposição ao PL nº 5.029/2019 (antigo PL nº 11.021-B/2018)

Brasília, 11 de setembro de 2019.

 

A Sua Excelência o Senhor
DAVID SAMUEL ALCOLUMBRE TOBELEM
Presidente do Senado Federal
Praça dos Três Poderes – CEP 70165-900
Brasília/DF

 

Excelentíssimo Senhor Presidente,

Com imensa decepção e preocupação extrema, as entidades signatárias tomaram conhecimento da aprovação pela Câmara dos Deputados no último dia 04 de setembro do Projeto de Lei (PL) 11.021-B/2018, que implica profundas alterações no sistema partidário brasileiro e no regramento de nossas eleições.

Entre outros graves retrocessos, a proposta compromete severamente a transparência das contas partidárias e a eficiência dos respectivos processos de fiscalização. Financiado fundamentalmente com recursos públicos, o sistema partidário brasileiro ainda é pouco transparente, mas a implementação do Sistema de Prestação de Contas Anuais (SPCA) pela Justiça Eleitoral, em 2017, representou o primeiro passo em termos de aprimoramento da transparência pública e da eficiência nos processos de auditoria das contas dos partidos. O PL 11.021-B/2018 retrocede nesse esforço ao permitir a utilização de qualquer sistema de gestão contábil para prestação das contas partidárias ao órgão de controle. [1] Esse conjunto de informações deixará, portanto, de ser padronizado, o que dificultará sobremaneira o controle social das contas dos partidos e o processo de análise e julgamento desses balanços pela Justiça Eleitoral.

Extremamente reprovável também é a determinação de que multas por desaprovação de contas partidárias apenas sejam aplicadas caso se comprove conduta dolosa. [2] Ademais de introduzir elemento de dificílima verificação em atividades de contabilidade, que demandará complexas diligências para produção de prova, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados pode significar verdadeira anistia a todas as prestações de contas ainda pendentes de julgamento, dado que a exigência de comprovação de conduta dolosa seria aplicável a todos os processos de prestação de contas partidárias que não tenham transitado em julgado em todas as instâncias. [3]

Ver post completo “Carta aberta conjunta de organizações em oposição ao PL nº 5.029/2019 (antigo PL nº 11.021-B/2018)”

Publicação reúne os resultados positivos para avaliação qualitativa

Ao longo do projeto Obra Transparente, voluntários de observatórios sociais locais participantes foram capacitados pela Transparência Brasil e realizaram atividades frequentes e qualificadas de controle social de obras públicas. Contando com o apoio de uma Câmara Técnica de engenheiros e advogados, os observadores foram capazes de identificar irregularidades e diversas falhas técnicas e legais na implementação dos projetos.

A publicação “Resultados positivos para avaliação qualitativa“, disponível também em inglês, reúne casos nos quais essa atuação se deu de forma especialmente positiva. Além do caso mais efetivo, em Araucária (PR), em que o controle social exercido pelos observadores gerou uma economia de mais de R$1 milhão, temos também os casos de Taubaté (SP), Foz do Iguaçu (PR), Goioerê (PR), São Paulo (SP) e Jequié (BA).

Essas atividades demonstram os impactos positivos do trabalho de controle social, que preenche as lacunas deixadas pela incapacidade das autoridades locais em garantir que condições legais de contratação sejam respeitadas ou que as empresas contratadas mantenham os padrões de qualidade necessários.

Além disso, nossas atividades de controle social resultaram na identificação de casos de alto risco que não teriam sido avaliados pelos órgãos de controle federais caso não estivéssemos presentes, já que não possuem capacidade de fiscalizar e analisar adequadamente o imenso volume de processos de contratação realizados a nível local.

Guias para controle social de obras públicas

O Manual de Controle Social de Obras Públicas é um material bastante completo, que orienta o acompanhamento de construções públicas em detalhes, desde seu planejamento à entrega.

Para estimular e facilitar o uso do manual, a Transparência Brasil preparou uma coleção de guias que vai orientar quem está começando a acompanhar o tema e agilizar a consulta de quem quer se aprofundar em especificidades do monitoramento.

São sete edições bem curtinhas que oferecem uma visão rápida e abrangente do exercício do controle social de obras públicas. Elas descrevem o essencial de cada etapa, com links para mais informações na parte correspondente do manual.

Confira cada edição:

#Guia 1 – Controle social de obras públicas;
#Guia 2 – Monitorando a contratação de uma obra;
#Guia 3 – Pontos críticos do projeto básico;
#Guia 4 – Execução da obra;
#Guia 5 – Os custos da obra;
#Guia 6 – Fiscalização da obra;
#Guia 7 – Recebimento da obra.

Você também encontra todas as edições estão reunidas numa única publicação neste link.

De olho nos contratos de merenda

Gostaria de contribuir para monitorar a merenda de crianças de todo o Brasil? Precisamos de voluntários(as) que façam essa fiscalização.

A Transparência Brasil precisa de voluntários(as) que coletem informações de contratos de merenda assinados pelas prefeituras de todo o Brasil.

O(a) voluntário(a) receberá um e-mail contendo uma pasta de contratos de merenda escolar e um formulário. O(a) voluntário(a) deverá preencher o formulário com as informações do contrato. Todo o trabalho será feito à distância.

As informações coletadas servirão para apurar se existem irregularidades nos contratos ou nas empresas que fornecem alimentos, garantindo assim uma melhor gestão do recurso público e uma alimentação escolar de qualidade

Iremos fiscalizar contratos de todo o Brasil, começando pelo estado do Rio Grande do Sul.

Para se inscrever, acesse a Plataforma de Voluntariado Atados.

Newsletter – agosto de 2019

Confira a edição de agosto da newsletter da Transparência Brasil. Ela tem periodicidade mensal e você também pode recebê-la no seu e-mail assim que ela fica pronta, inscrevendo-se aqui.

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Destaques de Agosto:

  • Irregularidades no uso de aplicativos de transporte por servidores da Prefeitura de São Paulo;
  • Chamada de voluntários para projeto de monitoramento de merenda da Transparência Brasil;
  • Implicações políticas das alterações no Coaf;
  • Notas em defesa da Lista Tríplice para chefia da PGR e alerta contra o risco de apagão de dados no Governo Federal.

Análises Técnicas de Projetos

No contexto do projeto Obra Transparente, a Transparência Brasil produziu algumas publicações que facilitam e orientam o controle social de obras públicas por cidadãos e organizações da sociedade civil.

Entre estas, destacamos alguns exemplos de análises realizadas pela Câmara Técnica do projeto no assessoramento aos observatórios sociais durante as atividades de monitoramento da contratação e execução de obras de escolas e creches em seus municípios.

As análises trazem dados, documentos e evidências utilizados nos monitoramentos que foram realizados nas cidades de Araucária (PR), Palhoça (SC) e Pelotas (RS). Os dados foram encaminhados às respectivas administrações municipais e a órgãos de controle.

Em Araucária, caso de maior sucesso, as denúncias produzidas pelos participantes do projeto foram analisadas e confirmadas pelo Tribunal de Contas da União, e geraram economia superior a R$ 1 milhão para a cidade.

‘Apagão’ de dados é risco para toda a sociedade: queremos mais transparência e respeito à ciência

As entidades abaixo-assinadas acompanham com preocupação a tendência do atual governo de contestar, sem base científica, dados produzidos por agências do próprio governo e institutos de pesquisa de sólida reputação. Também alertam para os riscos da interrupção de estudos científicos e mudanças em metodologias há anos aplicadas para apoiar políticas de interesse público, como as de preservação ambiental e de combate ao desmatamento.

A notícia da última sexta-feira (2 de agosto) da exoneração do diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, Ricardo Galvão, vem na esteira de uma série de outras ações direcionadas a institutos nos últimos meses, como IBGE, Ibama e Inep. Em vez de agir sobre a realidade, o governo prefere atacar os dados que a descrevem, demonstrando pouco apreço por estudos científicos e evidências que, na verdade, deveriam embasar as políticas públicas. 

Os dados do INPE que foram alvo de questionamento vêm sendo tornados públicos ativamente na plataforma Terra Brasilis, lançada pelo instituto em 2018 para reunir dados de dois importantes sistemas de monitoramento da vegetação nativa: o PRODES e o DETER. A divulgação desses dados indicava um aumento do desmatamento no país, o que gerou desconforto em setores do governo. O acesso aos dados públicos é fundamental para que a sociedade possa observar a realidade, realizar análises independentes sobre ações do governo e exercer o controle social para que os interesses públicos sejam defendidos.

O acesso à informação pública está previsto na Constituição brasileira e regulamentado pela Lei Federal nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação Pública – LAI). Por isso, dados públicos não devem ser vistos como instrumento publicitário, ou seja, usados apenas quando indicam situações favoráveis ou quando comprovam posições pré-estabelecidas. O compromisso de disponibilização de dados públicos completos, atuais e acessíveis é fundamental para que as discussões e decisões sobre políticas públicas sejam alicerçadas em fatos, evidências e participação social.

Além disso, o Brasil aderiu a compromissos internacionais na área de governo aberto, propondo-se a ampliar a informação disponível sobre atividades governamentais e implementar os mais altos padrões de integridade profissional em toda a administração pública. As recentes intervenções em institutos que coletam e disponibilizam dados cruciais para accountability e controle social são contrários a essas diretrizes, além de opostos a princípios constitucionais de moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência. Interromper a divulgação de dados que permitem o acompanhamento de outras obrigações internacionais, como o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, traz impactos negativos na imagem do Brasil, no âmbito das relações internacionais.

Os dados resultantes do trabalho de institutos de pesquisa e produção científica como o INPE não pertencem a um governo ou administração vigente, mas a toda a população brasileira. As organizações que assinam esta carta ressaltam a importância de que a produção e publicação dos dados seja mantida e fortalecida com os insumos necessários. Qualquer mudança metodológica na forma de coleta ou análise desses dados deve ser devidamente esclarecida e debatida com a sociedade civil, tratada com transparência e de acordo com os princípios de governo aberto e dos acordos internacionais. 

 

Assinam: 

  • Abraço Guarapiranga
  • Agenda Pública
  • Amasa – Amigos Associados de Analândia
  • ARTIGO 19 BRASIL
  • Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
  • Espaço de Formação Assessoria e Documentação
  • Greenpeace Brasil
  • Instituto Centro de Vida
  • Instituto Cidade Democrática
  • Instituto Construção
  • Instituto de Governo Aberto
  • Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (IMAFLORA) 
  • Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
  • Observatório do Código Florestal (OCF)
  • Open Knowledge Brasil (OKBr)
  • Programa Cidades Sustentáveis
  • Rede GTA – Grupo de Trabalho Amazônico
  • Rede pela Transparência e Participação Social (RETPS) 
  • Transparência Brasil

Newsletter – Julho de 2019

Confira a edição de julho da newsletter da Transparência Brasil. Ela tem periodicidade mensal e você também pode recebê-la no seu e-mail assim que ela fica pronta, inscrevendo-se aqui.

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Destaques de Julho:

  • Obra Transparente economiza mais de R$ 1 milhão em apenas uma das 20 cidades participantes do projeto;
  • Conheça os materiais para a fiscalização de obras públicas divulgados no site da Transparência Brasil;
  • colunas semanais do Manoel Galdino;
  • 48 organizações assinam nota em defesa da liberdade de imprensa
  • E o 1º Plano de Trabalho do Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção